quarta-feira, outubro 11, 2006

Diálogos pueris IX

Ele: Voltei para a minha namorada.
Ela: A sério? Deixaste a outra?
Ele: A outra, como tu dizes, nunca foi a outra.
Ela: Como não?
Ele: Estava com ela porque gostava de estar com ela.
Ela: Imagino que sim, mas...
Ele: A sério. Ela tem qualquer coisa que as outras pessoas não têm e fazia-me bem; fazia-me feliz. Não a teria trocado por ninguém.
Ela: Mas trocaste...
Ele: Não foi bem trocar, porque ela nunca foi realmente minha.
Ela: O que é que mudou?
Ele: Não é bem o que mudou; é mais o que nunca poderíamos mudar...
Ela: Ou seja...
Ele: O passado. A vida que tivemos antes de nos conhecermos.
Ela: Não estou a perceber.
Ele: Tenho uma utopia. Sabes o que é que eu queria para acabar de a construir?
Ela: Não. Conta.
Ele: Queria tê-la conhecido há muitos, muitos anos; queria ter convivido com ela desde sempre para que as coisas que lhe disse pudessem ter tido um sentido diferente, para que quando estávamos em grupo não tivéssemos que ter falado por meias palavras...
Ela: Mas isso também tem piada, não?
Ele: Não.
Ela: Ok. Ela está magoada contigo?
Ele: Mais ou menos. Mas eu sei que ela sabe que eu estava com ela porque queria, porque era livre e porque isso me dava prazer. E não porque era obrigado ou porque alguém me tinha pedido.
Ela: Alguém te pediu para voltares para a tua namorada?
Ele: Não. Mas é diferente.
Ela: Diferente como?
Ele: A minha vida era simples: ia à universidade, estava com os amigos, tomava café, falava sempre das mesmas coisas... Só quando chegava a casa dela é que me tornava especial, falava de coisas especiais, das coisas que interessam mesmo, sabes?
Ela: Porra, mas então porque não ficaste com ela?
Ele: Porque gostava muito de estar com ela, mas percebi que quando não estava, a minha vida não era um pesadelo.

segunda-feira, outubro 02, 2006

Diálogos pueris VIII

Ele: Preferia que ela tivesse acabado tudo comigo quando eu mereci...
Ela: O que é que teria mudado?
Ele: Talvez ainda estivéssemos juntos hoje.
Ela: Mas lembraste-te disso agora? Quando ela não vivia sem ti, tu sentias-te sufocado. Era isso que costumavas dizer, não era?
Ele: Porque não suportava a maneira como ela me via! Estava farto de ser tratado como uma pessoa bonita e diferente e especial...
Ela: Porquê?
Ele: Porque sabia que não era nada daquilo. Sentia que a estava a enganar.
Ela: Isso era suficiente para o que lhe fizeste?
Ele: Fui burro. Sempre soube que quando conseguisse atingir a imagem que ela tinha de mim já não estaria com ela.
Ela: Se sabias, por que é que não tentaste evitar que ela fosse embora?
Ele: Porque durante muito tempo achei que gostava mais dela pelas cartas que ela me escrevia do que por aquilo que ela era...
Ela: Mas nós também somos aquilo que escrevemos, não é?
Ele: Na altura, não achava isso. Na altura, achava-a só demasiado perfeita, demasiado esquematizada. E isso fazia-me ter medo que a minha vida não fizesse sentido.
Ela: Desculpa, não entendi.
Ele: Sentia que com ela ao meu lado nunca iria crescer.
Ela: Cresceste sem ela?
Ela: Não sei.
Ela: Tens saudades? De quê?
Ele: Da força dela. De como conseguia fazer-me acreditar que a vida vale a pena.
Ela: Já não vale?
Ele: Sempre lhe disse que se ela me deixasse nunca mais reconstruiria a minha vida. E isso, pelo menos, cumpri.

domingo, outubro 01, 2006

Diálogos pueris VII

Ela: Agora também apareces nas revistas a exibir a casa e o casamento?
Ele: Já não há casamento.
Ela: Desculpa?!
Ele: Quando a revista saiu já estávamos separados há dois meses.
Ela: Estás a gozar?!
Ele: Não. Infelizmente, não estou.
Ela: Divorciaste-te?
Ele: Oui.
Ela: Meteste o pé na argola em menos de seis meses?!
Ele: Não fui eu.
Ela: Como assim?
Ele: Descobri, ainda durante a lua-de-mel, que ela tinha outra pessoa... Ainda por cima, um azeiteiro!
Ela: Só podes estar a gozar...
Ele: Não estou.
Ela: Não pode ser...
Ele: Pode, pode...
Ela: Como é que descobriste?
Ele: Pelo telemóvel. Ela levava-o para todo o lado, até para a casa de banho...
Ela: Confiscaste-lhe o telemóvel?
Ele: As mensagens, sim.
Ela: E?
Ele: E havia frases a dizer "amo-te" e outras merdas do género...
Ela: E continuaste com ela mesmo sabendo isso?
Ele: Ela ainda é uma miúda. Pediu-me desculpa. Achei que podia salvar o casamento.
Ela: !!!
Ele: Depois percebi que ela só estava interessada no meu dinheiro.
Ela: Ela disse isso?
Ele: Disse que o que eu ganho não era suficiente para ela.