sábado, abril 28, 2007

Diálogos pueris XXII

Ele: Estou tão arrependido...
Ela: Agora?!
Ele: Percebi que não deixei de gostar dela; tinha só esquecido que gostava. Achas isto possível, não propriamente esquecer uma pessoa, mas o que se sente por ela?
Ela: Acho tudo possível...
Ele: Disse-lhe que quero voltar para casa.
Ela: E ela?
Ele: Diz que tem medo. Medo que eu volte a ir embora...
Ela: Que garantia lhe dás de que isso não volta a acontecer?
Ele: É a mãe do meu filho.
Ela: Já era quando saíste de casa...
Ele: Mas agora é diferente. Quando o bebé nasceu assustei-me. Não estava preparado.
Ela: E achas que ela também não estava?!
Ele: Pois, eu sei. Fui um cabrão!
Ela: Quanto tempo passaste sem ver o miúdo?
Ele: Quase um ano. Mas agora existe uma química incrível entre nós. Ele conhece-me. E é como eu.
Ela: Um ano é muito tempo...
Ele: Não é assim tanto se pensarmos nos anos todos que ainda restam....
Ela: Sim, é uma perspectiva. Mas então, e agora?
Ele: Agora, ela tem que ser uma mulher a sério.
Ela: Ela ainda não decidiu se quer que voltes para casa e já estás a impor condições? O que é isso de ser uma mulher a sério?
Ele: É parar de seduzir os meus amigos e os dela; é deixar de entregar o filho à avó para poder sair à noite; é deixar de se vestir como se tivesse 15 anos; é cultivar-se; é parar de se relacionar com pessoas que não lhe ensinam nada e que só a adulam porque não podem ser como ela...
Ela: Uau! Isso tudo? Gostas de exactamente o quê nela?
Ele: Boa pergunta. Não sei. Mas sei que gosto.

sábado, março 24, 2007

Diálogos pueris XXI


Ele: Preciso de um vibrador...
Ela: Precisas mais de um calmante...
Ele: Também. Preciso dos dois.
Ela: Porquê? O que te inquieta?
Ele: Pá, inquieta-me o facto de estar farto de ser fiel.
Ela: Desculpa?!
Ele: Ou melhor, inquieta-me o facto de querer sentir outras coisas...
Ela: Mas tu já disseste que é possível ser fiel e sentir outras coisas ao mesmo tempo...
Ele: Pá, já não sei o que digo...
Ela: Então???
Ele: Já não sei o que é ter outra mulher há séculos!!!
Ela: Não é suposto ser assim?!
Ele: Não, não é. Pelo menos comigo não deve ser, se chego a esta fase a precisar tanto de, desculpa a franqueza, foder...
Ela: E porque é que não fazes nada?
Ele: Fazer o quê?
Ela: Foder! Não é isso que queres?
Ele: Com quem???
Ela: Porra, sei lá! Isso tu é que tens que saber!!!! Não é suposto teres vontade de o fazer com uma pessoa concreta? Que exista? Que te tenha despertado a vontade de o fazer?
Ele: Ya, mais do que uma até...
Ela: Mas...
Ele: Mas, feliz ou infelizmente, isto não é propriamente um supermercado...
Ela: Confessa lá: a verdade é que, neste momento, não há ninguém que te dê a volta à cabeça.
Ele: Não, neste momento não há ninguém que me dê a volta à cabeça. Nem sequer a minha mulher.

sexta-feira, março 23, 2007

Diálogos pueris XX

Ele: Porque é que achas que deixei de estar com ela?
Ela: Nunca soube...
Ele: É simples: traiu-me.
Ela: ...
Ele: Não faças essa cara! Eu sei que não estás propriamente espantada.
Ela: Não faças perguntas às quais não posso responder.
Ele: Sempre soube das histórias todas... dentro de mim! Achas que andava a dormir?
Ela: Não sei.
Ele: Tantos anos depois e estas coisas só me dão vontade de rir...
Ela: Estás a mentir.
Ele: Não estou a mentir. Dão-me vontade de rir, embora sejam tristes, obviamente. Nunca mais fui o mesmo. Nunca mais fui o mesmo com ninguém.
Ela: Tu gostavas mesmo dela, não era?
Ele: Não! Não gostava mesmo dela. Aquilo não era gostar; era ser burro e ter paciência de jó!
Ela: Se não tivesses gostado mesmo dela não tinhas mudado assim tanto, não é?
Ele: Claro que gostava dela! Quando gosto, gosto a sério. Claro que não tinha mudado tanto!
Ela: Isso parece que ainda te dói...
Ele: Dói-me que ela tenha sido burra. Que nunca tenha percebido que a entrega incondicional e a dedicação fiel são das coisas mais bonitas que podem existir.
Ela: Quem está a pagar a factura dessa mudança?
Ele: Eu. Quem havia de ser?

Diálogos pueris XIX

Ela: Como está a tua vida?
Ele: Com a minha namorada?
Ela: Sim.
Ele: Há dias melhores do que outros. Há fases mais agradáveis. E outras em que ambos sentimos que o fim pode ser uma hipótese. Falamos muito, isso ajuda.
Ela: Mas essa hipótese é real?
Ele: Não sei. Ela ainda tem um caminho longo a percorrer dentro dela.
Ela: Já não a imagino sem ti.
Ele: O último Verão foi muito difícil. Estivemos por um fio. Depois as coisas melhoraram.
Ela: Ela deu um salto contigo.
Ele: Pois, mas eu não sou responsável por isso. Ela é.
Ela: Também és.
Ele: Sim, talvez em parte. Mas o que é nuclear para ela ainda tem que ser esculpido. Temos muitas diferenças que nos separam. Mas sim, ela tem um je ne sais quoi que a torna especial.
Ela: Ela é absolutamente especial.
Ele: Não somos todos?!... As relações são sempre uma fonte de dúvidas e incertezas. Às vezes acho que os estilos de vida modernos não favorecem relações mais longas do que o "one night stand".
Ela: Tenho dúvidas sobre isso.
Ele: Também não tenho certezas. E nós insistimos em tentar mostrar que é possível. Mas perguntaste isso por algum presentimento particular?
Ela: Senti-vos de forma diferente.
Ele: Diferente como?
Ela: Não sei bem... como se tivesse deixado de haver um para passar a haver ser dois...
Ele: Tenho incentivado um pouco isso.
Ela: Sim, também senti que isso vinha sobretudo de ti.
Ele: Não é um incentivo no sentido de nos distanciarmos, sabes? É mais no sentido de eu ter a certeza que ela tem vida, pensamentos e amizades para além de mim e da nossa relação.
Ela: Está a funcionar?
Ele: Como uma espécie de ventilação, acho que sim.
Ela: Conversaram sobre isso?
Ele: Claro. E acho que ela acabou por entender facilmente. Isto aconteceu apenas para ela não se fechar numa única forma de ver e para se sentir livre de explorar o mundo e a própria vida dela.
Ela: Isso não é um bocadinho pedagógico-paternalista demais?
Ele: Não. Acho que assim me amará melhor.

quinta-feira, março 22, 2007

Diálogos pueris XVIII

Ele: Gostava de ter estado mais tempo contigo. Sozinho contigo, digo.
Ela: Pois...
Ele: Aliás, tenho pensado numa carta para ti, mas não sei se alguma vez a vou escrever.
Ela: Então?
Ele: São apenas ideias sobre o que vou pensando de ti.
Ela: Que tens pensado?
Ele: No que conheço de ti... Gostei de estar contigo, apesar de tudo.
Ela: Mas não falaste muito...
Ele: Não. Mas achei graça... vives num mundo tão distante...
Ela: Do teu?
Ele: Sim. As histórias, os assuntos, os personagens, que não são os meus...
Ela: Nada será assim tão diferente...
Ele: A sério que é... Estava a provar o teu mundo e a achar um piadão. Aliás, foi essa perspectiva que me deixou a pensar. A ideia que construí de ti é mesmo contrastante...
Ela: Contrastante?!
Ele: Sim. É difícil explicar e até pode ser que seja fruto da minha imaginação "améliana", mas fiquei com a sensação de que és um personagem demasiado sensível...
Ela: No meio dos outros?
Ele: Sim. Do tipo: como se sente uma rosa entre os espinhos que a embrulham?
Ela: Essa foi a ideia que ganhaste ou a que perdeste?
Ele: Não, não... foi com essa ideia com que saí de lá... Não faz sentido nenhum, pois não?
Ela: Não sei bem...
Ele: Reparei em pequenas coisas que podem não fazer sentido, mas...
Ela: Por exemplo?
Ele: Lembrei-me daquela vez em que tomámos café no meio de um trabalho teu. Já foi há algum tempo e também não é importante. Mas nesse dia reparei que enquanto falavas o teu maxilar ganhava tensão. E acho que foi a primeira vez que reparei nisso.
Ela: Sim, lembro-me dessa tarde...
Ele: Na semana passada pareceu-me que essa tensão estava lá outra vez.
Ela: É possível.
Ele: Curiosamente, senti o maxilar livre quando falavas do que tinhas sentido...
Ela: É verdade, essa tensão existe volta e meia. E deve realmente notar-se, porque não és a primeira pessoa a dizer isso...
Ele: A minha imaginação disse-me automaticamente que és mais livre quando falas dos sentimentos... Mas os espinhos logo mostraram que existem e tu recolheste-te... Foi aí que surgiu a tensão. Mas achei-te muito bonita.
Ela: Para ti, as outras pessoas são espinhos?
Ele: Não sou eu que as vejo assim. Para ti, algumas pessoas é que parecem funcionar como espinhos. Não digo que o sejam sempre. Aliás, talvez não sejam elas os espinhos. Apenas, talvez, sejas tu a flor: delicada, perfumada, atraente. E bonita, como estava a dizer.
Ela: Isso é muita imaginação. Mas sim, às vezes sinto-me dessintonizada. Como se me tivesse enganado no apeadeiro. Tinha idealizado um feito de coisas mais simples. Achava eu, pelo menos. Ele: Percebo bem o que estás a dizer. Mas nem sempre o hábito faz o monge. E não te sinto escrava do que não queres. Precisamente, por seres mais do que isso.
Ela: Queres que me sente no divã?
Ele: Quero saber o que te apetece...

segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Diálogos Pueris XVII

Ele: A minha veia poética voltou. Tinha que te avisar. Adeus, Wookie.
Ela: Estás apaixonado?
Ele: Sim.
Ela: Fico contente!
Ele: Hoje voltei a sentir... Estou feliz, finalmente!
Ela: Quer dizer que já podemos ser amigos?
Ele: Não. Ainda não.

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Diálogos pueris XVI


Ele: Estou cansado de mentir, sabes?
Ela: Porque é que mentes?
Ele: Para conseguir ter espaço para mim.
Ela: Espaço físico? Para estar sozinho? Ou com outra pessoa?
Ele: Espaço mental. Às outras pessoas, às outras mulheres, tenho tentado resistir.
Ela: Tens vontade de não resistir?
Ele: Às vezes. E tenho pensado cada vez mais nisso.
Ela: Na traição?
Ele: Não. Na durabilidade do amor...
Ela: ... do qual tu serás um belo exemplo...
Ele: Um exemplo, mas não propriamente belo.
Ela: Porque não?
Ele: Olho à minha volta e todos os meus amigos se separaram, menos eu.
Ela: Achas que és o único a estar errado?
Ele: Acho que sou o único sem coragem.
Ela: Mas porque havias de terminar uma relação onde existe amor?
Ele: Para quê mantê-la se já não existe aquele ardor?
Ela: Acreditas em relações onde esse ardor dura até ao fim da vida?
Ele: Não. Mas sei que não consigo ser feliz sem esse permanente estado de excitação.
Ela: Há outras coisas que só se ganham com o tempo. A cumplicidade, por exemplo.
Ele: O tempo?! Que tempo?! Achas que o amor é para ser conservado?! Nós não somos um museu!

quinta-feira, janeiro 04, 2007

Diálogos pueris XV

Ele: Estou sozinho outra vez.
Ela: Tens um problema com as mulheres!
Ele: Elas é que têm um problema comigo! Nenhuma me aguenta mais de seis meses!
Ela: É mais a tua ausência que elas não aguentam, não é?
Ele: É. É sempre assim: apaixono-me, começo a namorar, está tudo bem. Mas depois, passado alguns dias, tenho que ir embora. Já as aviso e tudo.
Ela: Avisas de quê?
Ele: Para não namorarem comigo; que eu passo muito tempo fora; que elas vão sofrer e eu, depois, também.
Ela: E elas dizem sempre que não faz mal, que são diferentes das outras...
Ele: (risos) ... que não vão chorar, que não vão fazer cenas de ciúmes se eu não ligar todos os dias, que vão esperar por mim...
Ela: E depois?
Ele: Depois, se chego cansado e não quero logo sair, acabam tudo...
Ela: Porque não gostas o suficiente...
Ele: E porque não tenho suficientes saudades...
Ela: Foi isso que voltou a acontecer?
Ele: Claro! É sempre assim. Já estou vacinado.
Ela: Não pareces vacinado.
Ele: Porque tentei fazer tudo de forma diferente desta vez e o resultado foi o mesmo.
Ela: Fizeste o quê?
Ele: Coisas que nunca fiz na vida! Marquei a passagem-de-ano em Paris, onde estão não sei quantos graus negativos e eu odeio frio. Marquei hotel, aluguei um carro...
Ela: Como as pessoas ditas normais...
Ele: Como as pessoas ditas normais. Mas ela...
Ela: Mas ela...
Ele: Mas ela acabou tudo na mesma!
Ela: Porquê?
Ele: Porque não telefonei nem respondi às mensagens quando cheguei.
Ela: Achas que foi só por isso?
Ele: Acho que as mulheres não aguentam relações à distância.
Ela: Já não vais a Paris?
Ele: Não. Mas só porque está frio. (risos)
Ela: E tu não gostas de frio...
Ele: É melhor pensar assim, não é?