domingo, janeiro 10, 2010

Diálogos pueris XXX

Ele: Ficas assim só porque de repente reaparece uma pessoa que fez parte da tua vida no passado?
Ela: Assim como? Feliz?
Ele: Feliz não, histérica!
Ela: Não estou histérica, estou feliz.
Ele: Seja, feliz. Nunca enterras as tuas histórias, pois não?
Ela: Nunca.
Ele: Mas parece que nunca deixas de gostar...
Ela: Claro, e nunca deixo.
Ele: Não entendo.
Ela: O que é que não entendes?
Ele: Não entendo quando percebo que, eventualmente, me compararás facilmente com outros a qualquer momento, bastando para isso que o rapazito de Nova Iorque passe do outro lado da rua.
Ela: Mas isso é ridículo, eu não fiz comparação nenhuma. Gostar muito de alguém não significa passar a gostar menos dos outros.
Ele: Se uma mulher me fizesse isso, se eu sentisse que uma mulher, a minha mulher, sentisse vontade, uma imensurável vontade, uma amantizada vontade de atravessar a rua para ir ter com outro, podes ter a certeza que desapareceria de ambos os passeios.
Ela: [gargalhada] Estás a distorcer. Quem é que falou numa amantizada vontade?! Eu gosto de todas as pessoas que tive. Vou gostar sempre. Devia odiá-las?! Porquê, se não me fizeram mal nenhum?!
Ele: Romântica essa tua ideia, sem dúvida! É um bocadinho como o comunismo, coisa bonita, somos todos iguais e trá lá lá, cantando e rindo, mas depois vai-se a ver, e uns trabalham mais que os outros e talvez por isso uns devessem ganhar mais do que os outros, não?
Ela: Tu queres que eu desvirtue as pessoas, que as substime, que apague uma parte da minha vida só para provar que agora é que é a sério e importante. E isso eu não faço. Nunca fiz; nunca farei.
Ele: A tua ideia é comunista, o teu amor é vermelho, é marxista-leninista, é de foice, todos os teus amores - dizes - devem ser por igual. Não dás mais atenção, mais salário a nenhum deles. É tudo por igual! Mas há uns que trabalham mais, que fazem mais por ti, que te dão mais. E tu não queres saber, estás a dizer que são todos iguais!
Ela: Não estou a dizer que são todos iguais! Estou a dizer que são todos importantes!
Ele: E eu estou a dizer que isso, sendo romântico, é impossível!!!
Ela: O quê? Guardar as pessoas? Gostar de estar com elas?

Ele: Sim, dessa forma, não! Devias arrumá-las bem num canto do sótão, ok, não as tirando de lá se não quiseres, mas percebendo que aquilo é um quadro bonito que te faz se calhar sorrir quando olhas para lá, mas que está agora inerte, fixo, imutável.
Ela: Belo, vamos apagando o caminho, não é? Matando pessoas? Olhas para trás e vês um cemitério de afectos. É isso?
Ele: És palerma, mimalha, bipolar!

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