segunda-feira, junho 30, 2008

Diálogos pueris XXIII

Ele: Estou farto! Farto de nunca estar satisfeito com nada!
Ela: É verdade, nunca estás.
Ele: E depois magoo as pessoas à minha volta.
Ela: É verdade. Assim, vais acabar sozinho.
Ele: Não vou nada!
Ela: Daqui a uns anos falamos.
Ele: Se ficar é porque mereci.
Ela: E se não ficares era o que merecias.
Ele: Não julgues que me vou defender. Estou a tentar mudar, a tentar fazer as coisas certas. E se te consola um bocadinho, estou a sofrer.
Ela: Não sou eu tenho que tenho de ser consolada.
Ele: Ainda vou a tempo de fazer as coisas bem. Foi o que tentei fazer desta última vez.
Ela: O que é que fizeste de diferente?
Ele: Libertei-a.
Ela: Tu não a libertaste! Tu deixaste-a. Fizeste o que fazes sempre.
Ele: Mentira! Libertei-a porque gosto mesmo dela! Não achas isso importante?
Ela: Achava importante olhar para ti e perceber que aprendeste a amar alguém.
Ele: Se Deus quiser, ela há-de ter uma vida extraordinária.
Ela: Porra! Pára de falar como se fosses pai dela! Se Deus quiser o quê? Ela não é tua filha!
Ele: Sim, mas não sejas tão apressada a fazer tantas críticas!
Ela: Se tens uma mulher de 40 queres uma de 20, se tens uma de 20 queres uma de 50, se tens uma médica queres uma de fora da profissão, se trabalha fora queres uma da área, se é portuguesa queres uma russa, se é russa queres uma de Marte!
Ele: Não sabes a nossa história toda. E nem eu te vou contar!
Ela: SEMPRE FOSTE ASSIM!
Ele: Ok. Mereço isso.
Ela: E não interessa a última história. Eu não te conheci ontem. Nem é a primeira vez que te ouço dizer que estás a morrer de amor... e depois, que acabaste, mas que esperas que ela seja muito feliz porque é uma mulher extraordinária!
Ele: Pois é. Às vezes, preciso ouvir essas coisas. Mas estas coisas do coração são complicadas. Não penses que não me conheço!
Ela: Eu sei. O que só piora. Quer dizer que não tens vontade de ser melhor.
Ele: Obrigada.
Ela: Desculpa.
Ele: Compreendo a tua ira.
Ela: Desculpa. Não tenho nada a ver com isso.
Ele: Tens. E sabes que tens.
Ela: Não tenho. E sei que não tenho. Mas gostava tanto de te ver feliz...
Ele: Eu sei. Por isso é que tens o direito de me dizer coisas duras.
Ela: Se pudesses fazer as coisas certas, seria perfeito.
Ele: Eu sei. E gostava de fazer as coisas certas ao menos uma vez na vida. Tentei agora e acho que falhei escandalosamente.
Ela: Não digas "gostava tanto de..." como se isso não dependesse de ti.
Ele: Eu sei.
Ela: E pára de dizer "eu sei". Sabes quantas histórias dessas tuas eu já ouvi?
Ele: Não sei.
Ela: Parece que tens 15 anos, que não podes ver nada, que ainda estás na fase de provar lá no recreio da escola que consegues ter as meninas todas! É ridículo! Vais começar a parecer ridículo!Ele: Eu sei. Porque é que achas que estou a tentar parar?
Ela: Por causa do ego.
Ele: Por causa do ego?!
Ela: Sim. Mentiste-lhe sempre sobre a tua idade, por exemplo. Sabes que a tua namorada ou ex-namorada ou lá o que é, vai ser feliz. Hoje ou amanhã ou depois, não importa quando. E sabes que todas as pessoas com quem andaste acabam por encontrar a sua felicidade, cedo ou tarde. Só tu continuas a saltar, como se tivesses 15 anos. E depois, consolas-te - é outra das tuas fases cíclicas - nas tuas amigas divorciadas.
Ele: Mau, agora já estás a abusar! Nunca andei com nenhuma das minhas amigas divorciadas! Fiz infeliz uma mulher solteira, que ainda amo. Mais nada!
Ela: Desde que eu te conheço que tu me dizes que o amor não existe, que a fidelidade não existe!!!! Quem não acredita nisso nunca vai fazer ninguém feliz!
Ele: O amor existe, é bom e dá esperança. Mas não acredito na fidelidade, que queres que faça?
Ela: Nada. E tu queres o quê? Que te alivie a consciência?
Ele: Não. Aliás, é óbvio que estás a gostar de me condenar.
Ela: Queres que eu diga que és bonzinho, que não tens culpa, que magoas toda a gente que se cruza contigo, mas que é sempre sem querer?
Ele: Eu mereço isso. Mereço ser castigado. Mas estou a ser sincero quando te digo que não está a ser fácil.
Ela: Acredito em ti. Mas isso serve a quem?
Ele: Nã sei. Acho que tenho medo da intimidade. Do para sempre. Magoeei muita gente, é verdade. Mas também já fui magoado. Eu sei que a probabilidade de ficar sozinho é enorme.
Ela: Desculpa ter dito isso. Não vais nada ficar sozinho.
Ele: Não, não, tens razão. Mas não perdi a esperança. Não quero ser publicamente ridículo. E estou a sê-lo contigo.
Ela: O ridículo não está naquilo que me dizes a mim; está naquilo que às vezes fazes. Para mim nunca és ridículo.
Ele: Provavelmente, pode ser.
Ela: Mas estás a mentir. Não tens medo da intimidade, nem do para sempre. Tens só medo de uma coisa que nunca vais conseguir cumprir: que é teres todas as mulheres do planeta!
Ele: Estás a exagerar outra vez!
Ela: Não estou. Tu precisas de ser sempre o sedutor, o predador!
Ele: Ok, tens razão em quase tudo.
Ela: Porque é que ter razão não me deixa propriamente feliz?
Ele: Porque me adoras (risos)!
Ela: Porque gosto muito de ti, sim (risos)!